Regimes ditatoriais na América Latina

 


Países do continente viveram um mesmo período sob regimes ditatoriais. Imagem: AFP.
Países do continente viveram um mesmo período sob regimes ditatoriais. Imagem: AFP / Reprodução BBC. (ERD44)

Na segunda metade do século XX, algumas nações da América Latina viveram períodos muito sombrios de sua história. Foi o caso do Brasil, Bolívia, Argentina, Chile, Paraguai e Uruguai, que sofreram golpes de Estado e a instauração de ditaduras militares logo em sequência (em 1954, no Paraguai; em 1964, na Bolívia e no Brasil; em 1973, no Chile e no Uruguai; e em 1976 na Argentina). Todos esses regimes possuíam algumas características similares, e neste post a Politize! traz um ponto em comum entre eles: a Operação Condor.

Entender sobre a Operação Condor é importante para compreender como os militares agiam nos países da América Latina


Ditaduras e Sistemas de Inteligência

Antes de tudo, é importante esclarecer que, em governos ditatoriais, o monitoramento constante da população é uma das bases de sustentação do regime autoritário.

Quando se fala em “sistemas de inteligência”, ou “serviço de informações”, trata-se de atividades, como coleta de dados pessoais, realizadas a serviço do Estado. A utilização dessas informações, dentro dos regimes autoritários que abordaremos mais à frente, e dentro do contexto da Doutrina de Segurança Nacional (DSN), serviram à repressão e ao combate do chamado “inimigo interno”.

O conceito de “inimigo interno”, dentro da DSN, não necessariamente se configura como um alvo específico. Toda uma sociedade passa a ser suspeita, qualquer pessoa pode ser um subversivo em potencial. Portanto, a espionagem da população através dos sistemas de inteligência serviu aos governos militares em seu projeto de poder autoritário, no uso da força e da violência militar.

Apesar de toda e qualquer pessoa ser um potencial alvo de um regime, algumas figuras e organizações estavam na mira dos militares de um jeito mais evidente. Na ditadura militar brasileira (1964-1985), por exemplo, o Ato Institucional nº 1 viabilizou a “Operação Limpeza”.

Esta operação mobilizou as Forças Armadas a fim de procurar e prender todos aqueles que tinham ligações com movimentos sociais e partidos de esquerda. Pelo menos 50.000 pessoas foram presas nos primeiros meses após o golpe de 1964.

Além do Serviço Nacional de Informações (SNI), dos Centros de Informações das Forças Armadas e dos órgãos públicos, a ditadura brasileira também contava com o CIEx – Centro de Informações do Exterior.

O CIEx atuou espionando brasileiros em vários lugares do mundo, nas embaixadas do Brasil em países como Portugal, França, Rússia e República Checa. Ainda, operou no Uruguai, Chile e Argentina, participantes da Operação Condor

A Operação Condor na prática

A Operação Condor pode ser definida como um pacto repressivo de caráter internacional, firmado em 1975 na capital chilena. Na ocasião, estavam presentes representantes dos serviços de informação da Argentina, Brasil, Bolívia, Chile, Paraguai e Uruguai, e foi oficializada a integração entre os sistemas de inteligência e espionagem dessas ditaduras. Alguns historiadores afirmam que esta cooperação já existia antes mesmo da referida data.

Desse modo, a Condor foi um acordo entre os países do Cone Sul, criado para perseguir e punir pessoas que demonstrassem qualquer comportamento de oposição a estas ditaduras. A operação obteve intenso apoio dos EUA, que elaborou e difundiu a Doutrina de Segurança Nacional (DSN).

De maneira resumida, a DSN foi desenvolvida pelos Estados Unidos durante a Guerra Fria para combater a “ameaça comunista”. A doutrina pregava que o Estado poderia utilizar da força, quando julgasse necessário, em defesa da nação.

Neste contexto, não havia uma definição clara de quem era o inimigo; possibilitando, assim, que toda uma população fosse monitorada, controlada, e estivesse passível de sofrer prisões, torturas e mortes.

Na DSN não havia fronteiras na perseguição a opositores. Dentro ou fora de cada país, a violência de Estado operava, e para tanto os militares possuíam livre trânsito territorial, podendo atravessar fronteiras facilmente, sem restrições.

A operação ainda contava com apoio do Estado norte-americano, que fornecia vários tipos de suporte. Dentre eles: treinamento a soldados latino-americanos, verbas e financiamentos, sistema de comunicação, envio de militares para ministrar cursos e palestras.

As fases da Operação Condor

Pode-se afirmar que a Operação Condor funcionou em três etapas. A primeira consistiu na criação de um banco de dados, com informações de presos políticos, exilados, autoridades, organizações e pessoas envolvidas em atividades de oposição.

No Ministério da Justiça, por exemplo, há relatórios de embaixadas brasileiras, contendo detalhes sobre as atividades de cidadãos brasileiros em outros países.

A segunda etapa caracterizou-se pelas ações conjuntas nos territórios membros da Condor. Neste sentido, prisioneiros eram trocados de lugar sem qualquer registro de entrada ou saída do país.

Muitas pessoas foram sequestradas pelos militares em suas próprias casas e assassinadas nas fronteiras, sendo depois tratadas como “desaparecidas”.

Por fim, a terceira etapa era voltada para a formação de equipes de trabalho, que fossem capazes de combater os “inimigos” em qualquer lugar do planeta

O fim das ditaduras e os processos de transição

Com o enfraquecimento dos governos ditatoriais a partir dos anos 1980, os países do Cone Sul foram se aproximando de momentos mais favoráveis ao florescimento de regimes democráticos.

Na Argentina, a memória coletiva da população em relação ao regime foi bem construída. Em 1984 já se iniciaram os trabalhos de investigação dos desaparecimentos e violações de direitos humanos, sob grande pressão popular. A justiça de transição do país acabou se tornando, assim, um exemplo para o continente; também pelos julgamentos e punições a torturadores.

O Chile, em seu primeiro ano de redemocratização (1990), criou a primeira comissão da verdade no país, para apurar os crimes contra a humanidade cometidos durante o período ditatorial. No ano de 1992, a Lei de Reparação entrou em vigor, com o objetivo de reparar as famílias de vítimas diretas da ditadura. Em 2010, foi inaugurado o Museu da Memória e dos Direitos Humanos.

No Uruguai, a primeira Lei de Anistia, de 1985, foi um marco importante para a soltura de muitos presos políticos. Ainda neste ano foram criadas comissões de investigação, sendo uma delas voltada para os casos de crianças sequestradas, desaparecimentos forçados e torturas.

No caso brasileiro, a Lei de Anistia (1979), ainda em plena ditadura, foi um ponto chave no processo de redemocratização. Apesar disso, é uma lei que beneficiou também os perpetradores, dificultando, deste modo, investigações e condenações legais pelas graves violações de direitos humanos ocorridas no regime.

Em 1995, dez anos após a saída dos militares do governo, e com muita luta por parte dos familiares de pessoas mortas e desaparecidas pelo Estado brasileiro, foi formulada a Lei nº 9.140/1995.

Esta lei criou a Comissão Especial sobre Mortos e Desaparecidos Políticos (CEMDP), com o intuito de reparar os familiares, localizar e reconhecer as vítimas diretas da ditadura. Em 2001, foi fundada a Comissão de Anistia, e em 2012 a Comissão Nacional da Verdade, que entregou um relatório final em 2014.

Então… a Operação acabou?

As ditaduras militares na América Latina fazem, portanto, parte de um contexto de disputa política mundial, sendo desdobramentos da Guerra Fria.

A Operação Condor perdeu sua força com as transições democráticas, mas as marcas deixadas por ela e pelas ditaduras são permanentes. Ficaram sociedades traumatizadas, carregando as dores da repressão, da tortura, da perda de entes queridos, para sempre.

Ditadura, democracia, justiça de transição… Parece muita coisa, né? De fato, a história da América Latina é bem complexa, e o período em questão não é diferente.

Mas entender o passado é fundamental para que possamos, enquanto sociedade, construir um presente e um futuro melhores.


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Estadão ´Militares processados na Argentina

41% dos condenados receberam pena de prisão perpétua por sequestro, torturas e assassinatos de civis


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EXERCÍCIO DE HISTÓRIA

Leia os textos, assista aos vídeos e ANOTE perguntas e respostas no seu caderno de história


1- Explique as semelhanças entre as ditaduras militares brasileira (1964-1985), argentina (1976-1983),uruguaia (1973-1985) e chilena (1973-1990).


2- A eleição de Salvador Allende em 1970 no Chile constitui-se num acontecimento específico atípico no panorama geral da América Latina.

Sua política de governo se caracterizou por ser:

  1. Nacionalista, com exclusão de membros da Guarda Nacional – bastião de poder no governo anterior.
  2. Liberal, com livre importação de produtos manufaturados.
  3. Isolacionista no contexto continental, com pressões militares e econômicas por parte dos Estados Unidos.
  4. Democrática, com amplo respaldo popular e de grupos esquerdistas cristãos.
  5. Reformista, com privatizações dos bancos estatais e manutenção da reforma agrária iniciada anteriormente.


3- A Operação Condor está diretamente vinculada às experiências históricas das ditaduras civil-militares que se disseminaram pelo Cone Sul entre as décadas de 1960 e 1980. Depois do Brasil (e do Paraguai de Stroessner), foi a vez da Argentina (1966), Bolívia (1966 e 1971), Uruguai e Chile (1973) e Argentina (novamente, em 1976). Em todos os casos se instalaram ditaduras civil-militares (em menor ou maior medida) com base na Doutrina de Segurança Nacional e tendo como principais características um anticomunismo militante, a identificação do inimigo interno, a imposição do papel político das Forças Armadas e a definição de fronteiras ideológicas.

PADRÓS, E. S. et al. Ditadura de Segurança Nacional no Rio Grande do Sul (1964-1985): história e memória. Porto Alegre: Corag, 2009 (adaptado).

Levando-se em conta o contexto em que foi criada, a referida operação tinha como objetivo coordenar a

  1. Modificação de limites territoriais.
  2. Sobrevivência de oficiais exilados.
  3. Interferência de potências mundiais.
  4. Repressão de ativistas oposicionistas.
  5. Implantação de governos nacionalistas.

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